Ser abordado pela polícia e encontrado com drogas é uma das situações mais delicadas que uma pessoa pode enfrentar. O medo, a confusão e a falta de informação sobre o que pode acontecer a seguir são sentimentos comuns. Mas afinal, quais são seus direitos se você for preso por porte de drogas? O que diz a lei brasileira e como agir diante dessa situação?
Nesse post:
Neste artigo, vamos explicar de forma simples e prática o que é considerado porte para uso pessoal, o que caracteriza tráfico, quais são as consequências legais, e quais direitos fundamentais devem ser respeitados durante todo o processo.
O que é considerado “porte de drogas” segundo a lei
O porte de drogas é quando uma pessoa é flagrada transportando, guardando ou trazendo consigo substâncias ilícitas para uso próprio, sem intenção de vender ou distribuir.
Essa conduta está prevista no artigo 28 da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas), que estabelece:
“Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal, será submetido às seguintes penas: advertência, prestação de serviços à comunidade ou medida educativa.”
Ou seja, o porte para uso pessoal não gera prisão, mas é uma infração penal — não é crime com pena de reclusão, mas também não é legalizado.
Como saber se é porte para uso ou tráfico?
Essa é uma das maiores dúvidas — e também o ponto mais controverso. A lei não define uma quantidade específica para diferenciar o porte de drogas do tráfico.
Por isso, cabe à autoridade policial, ao Ministério Público e ao juiz analisarem o caso com base em alguns critérios, como:
- Quantidade e tipo da substância (ex: 2g de maconha é diferente de 200g de cocaína);
- Forma de acondicionamento (se está embalada em porções separadas, indica venda);
- Local e circunstâncias da abordagem (em locais de tráfico conhecido, por exemplo);
- Presença de dinheiro trocado ou balança de precisão;
- Antecedentes e conduta da pessoa abordada.
Por isso, duas pessoas com a mesma quantidade de droga podem ter destinos diferentes: uma responder por porte, outra por tráfico. É por isso que a assistência jurídica é essencial desde o primeiro momento.
Direitos durante a abordagem policial
Mesmo que a pessoa esteja sendo abordada sob suspeita de portar drogas, ela continua tendo todos os direitos constitucionais garantidos. Entre eles:
- Direito ao silêncio: você não é obrigado a responder perguntas que possam te incriminar.
- Direito a ser tratado com respeito e dignidade: nenhum tipo de violência física ou verbal é permitido.
- Direito de comunicar-se com um advogado e com a família: logo após a abordagem, o preso tem direito a informar alguém de confiança e solicitar um advogado.
- Direito à integridade física e moral: agressões, humilhações e ameaças configuram abuso de autoridade.
- Direito de ser informado sobre o motivo da prisão.
Essas garantias estão previstas na Constituição Federal (art. 5º) e na Lei de Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869/2019).
O que acontece após ser detido
Quando uma pessoa é levada à delegacia sob suspeita de porte de drogas, o procedimento depende da interpretação do delegado:
1. Se o delegado entender que é uso pessoal
O delegado lavra um Termo Circunstanciado (TC) — um registro mais simples, sem prisão.
O caso é enviado ao Juizado Especial Criminal, e o indivíduo é liberado, comprometendo-se a comparecer em audiência.
As possíveis sanções são:
- Advertência sobre os efeitos das drogas;
- Prestação de serviços à comunidade;
- Comparecimento a programa educativo.
2. Se o delegado entender que é tráfico de drogas
A situação é muito mais grave. O delegado lavra um auto de prisão em flagrante e encaminha o preso para a audiência de custódia, onde o juiz decidirá se ele responderá em liberdade ou permanecerá preso.
Audiência de custódia: o que é e por que é importante
A audiência de custódia deve ocorrer em até 24 horas após a prisão, e tem como objetivo garantir que o detido não sofreu abusos e que sua prisão é legal.
Nessa audiência, o juiz analisa:
- Se houve violência policial ou irregularidades na abordagem;
- Se a prisão é realmente necessária;
- Se é possível aplicar medidas cautelares em vez de prisão (como uso de tornozeleira ou comparecimento periódico em juízo).
A presença de um advogado criminalista nessa fase é fundamental para garantir que os direitos do acusado sejam respeitados e que ele tenha uma defesa técnica adequada.
(Saiba mais em nosso artigo: Audiência de custódia: 5 pontos para se preparar bem)
É possível responder em liberdade?
Sim. Em muitos casos, especialmente quando há indícios de que a droga era para consumo próprio, o juiz pode conceder liberdade provisória.
As principais medidas alternativas à prisão são:
- Comparecimento periódico em juízo;
- Proibição de frequentar determinados lugares;
- Proibição de se ausentar da comarca;
- Recolhimento domiciliar noturno.
Essas medidas são previstas no art. 319 do Código de Processo Penal e servem para garantir o acompanhamento do processo sem necessidade de prisão preventiva.
(Veja também: Medidas cautelares em vez de prisão: opções e requisitos)
O papel do advogado criminalista
Um dos direitos mais importantes do preso é o acesso imediato a um advogado.
O advogado atua para:
- Garantir que a prisão seja legal e sem abuso;
- Acompanhar o interrogatório e a audiência de custódia;
- Solicitar liberdade provisória ou relaxamento da prisão ilegal;
- Analisar o inquérito e orientar o cliente sobre as etapas seguintes;
- Em casos de tráfico, avaliar a possibilidade de desclassificação para uso pessoal.
Sem orientação jurídica, há grande risco de o acusado ser injustamente enquadrado como traficante, especialmente em casos com pequena quantidade de droga.
O que acontece com a ficha criminal
Muitas pessoas acreditam que o porte de drogas “mancha” a ficha criminal. Isso depende do caso:
- Porte para uso pessoal (art. 28): não gera antecedentes criminais, mas consta no sistema como termo circunstanciado, até o cumprimento da medida educativa.
- Tráfico (art. 33): é crime grave e gera antecedentes, podendo dificultar emprego, viagens e benefícios penais.
Por isso, é importante cumprir integralmente as medidas aplicadas e evitar reincidência, pois a repetição pode ser interpretada como envolvimento com o tráfico.
Posso ser revistado sem mandado?
Sim, desde que existam fundadas suspeitas de que a pessoa está com drogas ou armas. A revista pessoal é permitida pela Lei nº 11.343/2006 e pelo Código de Processo Penal (art. 244).
Porém, ela deve respeitar critérios de legalidade e razoabilidade:
- Deve ocorrer em local público e de forma discreta;
- Mulheres só podem ser revistadas por policiais femininas;
- É proibido revistar de forma vexatória ou humilhante;
- Não pode haver abuso de autoridade.
Caso haja abuso, o cidadão pode registrar denúncia na Corregedoria da Polícia ou procurar um advogado para representar judicialmente o caso.
Diferença entre “porte” e “tráfico”
Aspecto | Porte (Art. 28) | Tráfico (Art. 33) |
---|---|---|
Finalidade | Uso pessoal | Venda, distribuição ou fornecimento |
Pena | Advertência, serviços comunitários ou medida educativa | Reclusão de 5 a 15 anos e multa |
Prisão em flagrante | Não há prisão (apenas termo circunstanciado) | Há prisão em flagrante |
Competência | Juizado Especial Criminal | Vara Criminal |
Possibilidade de fiança | Não aplicável | Possível, mas depende da decisão judicial |
Posso ser preso por portar pequena quantidade?
Sim, é possível ser detido para verificação, mas não pode haver prisão definitiva por uso pessoal.
Mesmo pequenas quantidades podem gerar confusão se a polícia suspeitar de tráfico. Por isso, é essencial:
- Manter a calma e não reagir à abordagem;
- Não confessar venda nem fazer declarações sem advogado;
- Solicitar o Termo Circunstanciado e o advogado de defesa.
O que fazer após ser liberado
Se você foi liberado após o porte para uso pessoal, deve comparecer à audiência do Juizado Especial na data marcada.
Nessa audiência, é possível propor:
- Acordo de não persecução penal (ANPP), quando aplicável;
- Cumprimento de medidas alternativas;
- Encerramento do caso após o cumprimento da pena educativa.
A ausência injustificada pode gerar mandado de condução coercitiva, por isso, nunca ignore intimações.
E se a prisão foi injusta?
Infelizmente, há casos em que pessoas inocentes são presas injustamente por porte ou tráfico, especialmente quando há erro na investigação.
Nessas situações, o advogado pode:
- Pedir relaxamento da prisão (quando há irregularidade);
- Entrar com Habeas Corpus;
- Solicitar indenização por prisão ilegal, conforme o art. 5º, inciso LXXV, da Constituição.
(Saiba mais em: Habeas Corpus: O Que É, Quando Cabe e Como Funciona na Prática)
Fontes confiáveis sobre o tema
Para quem deseja consultar a legislação e orientações oficiais, recomenda-se acessar o site do Ministério da Justiça e Segurança Pública, onde há informações atualizadas sobre a Lei de Drogas e políticas de prevenção.
Resumo rápido: principais pontos
- Porte de drogas para uso pessoal não gera prisão, mas há sanções educativas.
- Tráfico de drogas é crime grave e pode levar à reclusão de 5 a 15 anos.
- Sempre solicite um advogado em caso de prisão ou abordagem.
- Você tem direito à integridade física e ao silêncio.
- Audiência de custódia deve ocorrer em até 24 horas.
- Abusos policiais podem ser denunciados e gerar responsabilização.
- Cumprir as medidas aplicadas é essencial para limpar o histórico e evitar reincidência.
Perguntas Frequentes
Posso ser preso se estiver fumando maconha?
Depende da quantidade e da situação. Para uso pessoal, não há prisão, mas há sanções. Se houver indícios de tráfico, o enquadramento muda.
A polícia pode entrar na minha casa sem mandado?
Somente em casos de flagrante delito, socorro ou desastre. Fora disso, é necessário mandado judicial.
O que fazer se fui agredido durante a abordagem?
Procure um advogado e registre o caso na Corregedoria da Polícia. O abuso de autoridade é crime.
O advogado é obrigatório em casos de porte para uso?
Sim, é importante desde o início para garantir a correta tipificação do caso e evitar injustiças.
Porte e tráfico são julgados da mesma forma?
Não. O porte é tratado no Juizado Especial e o tráfico na Vara Criminal, com penas muito mais severas.
Conclusão
Ser preso por porte de drogas é uma situação que exige calma, informação e apoio jurídico imediato. Conhecer seus direitos é o primeiro passo para garantir um tratamento justo e evitar abusos.
A atuação de um advogado especializado é fundamental para avaliar as circunstâncias, orientar sobre as medidas cabíveis e, quando possível, garantir que o processo siga de forma justa e humana.
Artigo produzido pela equipe jurídica da Dra. Émilin Rocha – Rocha Advogados Associados.
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